Sinto-me como um equilibrista em
seus primeiros meses de treino. Caio, levanto, depois caio novamente. Não é
fácil. Na verdade, é bem difícil treinar um novo andar, um andar em duas
pernas. O mundo segue, os problemas chegam e ninguém espera você aprender a ser
singular. Mas, com o tempo, as luzes apagam e acendem e você começa a gostar mais desse novo
estar. Como uma peça de quebra-cabeça que ainda não se encaixou completamente,
mas está perfeitamente posicionada no seu vazio ideal, na porta de entrada da
sua própria caverna interior! Você olha pra dentro e percebe que, de verdade,
você nunca esteve ali. Não assim, tão entregue, tão livre, com tanto tempo pra
perder. Tem tantas coisas para arrumar,
mas você caminha aos poucos... Coloca um vaso de flor na janela dos olhos, uma
nova toalha na cortina da alma. E assim segue... Com uma felicidade tímida no
canto do rosto e uma estranheza gostosa, como quando acaba de desencaixotar a
mudança. Se distrai um pouco e inesperadamente nota que
já dá até pra pular com um pé só! Olha para os lados e percebe que não tem mais
volta: você mudou! Você, definitivamente, se mudou!
(Mani Jardim - trecho de A Fresta de Minha Fossa
Abissal)